A Parceria Público-Privada e o Parcelamento do Objeto

298.1 – Ofende ao princípio do parcelamento do objeto a inclusão da construção de prédio no âmbito da contratação de parceria público-privada destinada à prestação de serviços de manutenção e conservação de sistema viário.  O Plenário apreciou representação acerca de possíveis irregularidades no âmbito de concorrência realizada pelo Governo do Estado do Ceará para a celebração de parceria público-privada (PPP), na modalidade concessão administrativa, tendo por objeto a prestação de serviços de manutenção e conservação estrutural e rodoviária do sistema viário de interseção e acessos de vias urbanas à CE-040, incluindo a Ponte Estaiada sobre o Rio Cocó, bem como os serviços de operação, manutenção, conservação e exploração do Mirante, a serem precedidos das obras de construção e implantação das melhorias do sistema viário de mobilidade urbana de Fortaleza e Mirante. Uma das irregularidades suscitadas nos autos consistiu na inclusão no edital de obra não contemplada no objeto da licitação (construção de prédio em troca do atual centro administrativo do governo cearense, negócio jurídico especificado no edital como “dação em pagamento”), ante a ofensa ao princípio do parcelamento do objeto, com fuga ao devido procedimento licitatório. A assessoria da unidade técnica instrutiva, ao analisar as respostas às audiências, considerou correta a modelagem de licitação adotada pelo poder público estadual, com a inclusão da construção do novo prédio que abrigaria a sede da Procuradoria-Geral do Estado, visto que essa obra caracterizaria uma obrigação acessória do parceiro privado, sem a integração do seu valor na equação econômico-financeira formulada para a PPP. O secretário da unidade técnica, por sua vez, entendeu que a questão referente à dação em pagamento seria interna ao Estado do Ceará, uma vez que a União arcaria estritamente com os custos relacionados à mobilidade urbana. Divergindo dos posicionamentos da unidade técnica, o relator esclareceu inicialmente que o total de recursos públicos que seriam transferidos ao concessionário vencedor seria de R$ 338 milhões, sendo R$ 259 milhões de recursos federais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), R$ 29 milhões de recursos estaduais e R$ 50 milhões da operação denominada “dação em pagamento”, que consistiria na transferência do Governo do Estado do Ceará para o consórcio vencedor da propriedade do imóvel onde hoje se situa o Centro Administrativo Bárbara de Alencar (bem público), avaliado pela Caixa Econômica Federal em R$ 83.480.000,00. Para se chegar no valor de R$ 50 milhões previsto no edital, o consórcio vencedor teria a obrigação de construir um edifício onde ficaria a nova sede da Procuradoria-Geral do Estado ao custo de R$ 33.480.000,00 (R$ 83.480.000,00 – R$ 50.000.000,00). Dito isso, observou o relator não constar dos autos indicação alguma de que os recursos federais seriam utilizados unicamente para as obras de mobilidade urbana, destacando ademais que, em linguagem popular, “‘o dinheiro não é carimbado’, de maneira que qualquer alteração no montante de uma modalidade influencia no valor das outras modalidades”. Outrossim, identificou no mencionado procedimento violação aos princípios e às normas regentes das licitações, com fuga ao dever de se realizar o devido processo licitatório para a construção de obra pública estranha ao objeto da PPP, neste caso, o novo prédio da Procuradoria-Geral do Estado. Explicou o relator que, nos termos do art. 2º da Lei 11.079/2004, a parceria público-privada consiste em contrato administrativo de concessão de serviço público que pode ser empreendida na modalidade patrocinada, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários, contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado, ou na modalidade administrativa, quando a administração pública for a usuária direta ou indireta do serviço público, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. Nesse contexto, prosseguiu, não se mostraria razoável permitir a inclusão de obras claramente estranhas ao objeto da concessão de PPP, “a exemplo do que ocorre no presente caso concreto, em que se pretende incluir a construção de um prédio no bojo de uma PPP destinada à prestação de serviços de manutenção e conservação estrutural e rodoviária de sistema viário estadual”. Sendo assim, concluiu que “a construção de tal obra no âmbito da aludida PPP, destinada à prestação de serviços de manutenção rodoviária, ofende ao princípio do parcelamento do objeto, além de trazer dificuldades adicionais para a devida definição dos custos unitários e total do empreendimento”. Considerando que o Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE/CE) já houvera determinado a alteração dos anexos do edital da concorrência em questão para excluir qualquer menção ou condição alusiva à entrega do edifício-sede da procuradoria, decidiu o TCU, com fundamento no voto do relator, em fixar prazo à Comissão Central de Concorrências do Estado do Ceará para adoção de providências com vistas à anulação do certame em razão de outras falhas discutidas nos autos, sem prejuízo de determinar, em caso de nova licitação, dentre outras medidas, a inclusão no edital das modificações determinadas pelo TCE/CE.  Acórdão 1988/2016 Plenário, Representação, Relator Ministro Augusto Nardes.



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